“Entende-se por concepturo o filho que não foi concebido, mas há esperança de vir a ser. É, portanto, aquele que será concebido no futuro. Por esse caráter de incerteza, é chamado também filiação eventual. No Código Civil de 1916 era chamado “prole eventual”[1].
Sendo um indivíduo que ainda não foi concebido, e sequer sendo certo que o será no futuro, o concepturo nada mais é que uma possibilidade, uma condição que pode ou não ocorrer. Nesse sentido, parte da doutrina inclusive afirma que o concepturo seria uma ficção jurídica[2], criada pelo direito para salvaguardar a vontade do testador.
De fato, a figura do concepturo foi criada com o intuito de garantir a liberdade testamentária, dando maior opção ao testador no que toca ao seu direito de disposição patrimonial. Nesse sentido, o Código Civil permite que o testador, ao escolher o destino de seus bens, institua como herdeiro ou legatário alguém que, a despeito de ainda não existir, possa vir a existir futuramente. Ora, a produção de efeitos do testamento pressupõe a morte do testador, e, uma vez ocorrido o evento fatal, passa a correr o prazo de dois anos para o concepturo se tornar nascituro sob pena de decadência da disposição testamentária que voltará ao monte mor partível.
É justamente por este motivo que, de modo a garantir que o testamento reflita a vontade do testador mesmo que as circunstâncias se alterem após sua morte, o Código Civil permite ao mesmo, antevendo essa mudança fática, já consignar no testamento qual seria sua vontade, ou seja, se concretizada a potencialidade vislumbrada, no caso o nascimento de herdeiro ainda inexistente.
Em que pese ter dispensado essa faculdade ao testador, o Código Civil, preocupado com os problemas decorrentes da indefinição da titularidade dos bens da herança, estabelece o prazo de dois anos, contados da abertura da sucessão, para a concepção da prole eventual, sob pena de caducidade da deixa testamentária (art. 1.800, § 4º, do Código Civil). O tema será mais bem aprofundado no capítulo relativo aos direitos sucessórios, no tomo III do presente tratado[3].
No entanto, observe-se que, para o indivíduo ter capacidade sucessória passiva, ou seja, para poder herdar, será necessário ter havido a concepção até o momento de abertura da sucessão, aguardando-se, a partir de então, o seu efetivo nascimento com vida para que os bens se incorporem à sua pessoa. É somente a partir desse momento que passa a ter aderência econômica e completa a titularização integral de todos os seus direitos, tornando-se pessoa para todos os fins”.
Fonte: KÜMPEL, Vitor Frederico et. al., Tratado Notarial e Registral vol. II, 1ª ed, São Paulo: YK Editora, 2017, p. 110-111.
[1] Note-se que o art. 1.718 do CC/1916 utilizava a expressão “prole eventual” para se referir a pessoas designadas pelo testador e existentes ao abrir-se a sucessão. Já o art. 1.799, inciso I, do CC/2002, faz referência a “filhos, ainda não concebidos, de pessoas indicadas pelo testador, desde que vivas estas ao abrir-se a sucessão”.
[2] Caio Mário da Silva Pereira, Instituições de Direito Civil – Direito das sucessões, vol. VI, 17ª ed., Rio de Janeiro, Forense, 2010, p. 27.
[3] O tomo III disciplina o Tabelionato de Notas; o Tabelionato e Ofício de Registro de Contratos Marítimos; o Ofício de Distribuição e Distribuidores.