Como são classificados os sistemas registrais quanto aos seus efeitos substantivos? Qual é o sistema adotado pelo Brasil?

De acordo com Orlando de Carvalho, são três os sistemas que valoram diferentemente a publicidade registral: o sistema do título, o sistema do título e do modo e o sistema do modo[1].

 

I. Sistema do título:

 

“O título é a causa que justifica a mutação da situação jurídico real, ou seja, o fundamento jurídico da mutação dominial. é importante ressaltar que os princípios da unidade e da consensualidade formam esse modelo registral. Estabelecem que os direitos reais se constituem e se transmitem por mero efeito do contrato. Logo, a modificação, a constituição, a transmissão e a extinção, ou seja, tudo aquilo que ocorre na vida do direito real está no seu título.

O contrato é a causa típica ou o título típico da constituição e da transmissão dos direitos reais.

O sistema do título é o adotado na Itália, França, Bélgica, Portugal e Luxemburgo. Em todos esses países, o título é suficiente para adquirir, modificar, transmitir ou extinguir direitos reais[2]. O assento registral tem natureza declarativa, consolida oponibilidade erga omnes perante os terceiros.”

 

II. Sistema do título e modo:

 

“Não há unanimidade na doutrina acerca do modelo de transmissão adotado no Brasil, sendo possível encontrar, pelo menos, quatro “grupos” de posições doutrinárias distintas entre os autores nacionais. Para facilitar o entendimento e evitar confusões terminológicas, é necessário conceituar dois princípios absolutamente distintos do direito das coisas.

O princípio da separação (Trennungsprinzip), impõe a distinção entre dois negócios jurídicos distintos. De um lado, o negócio jurídico obrigacional, por meio do qual é criada a relação jurídica de direito das obrigações entre as partes, como um contrato de compra e venda, doação, etc. Do outro lado, o negócio jurídico de disposição, cujo conteúdo é, exclusivamente, destinado à transmissão da propriedade do alienante ao adquirente.

O princípio da separação, por sua vez, não se confunde com o princípio da tradição. Este determina que, além da manifestação de vontade (em um ou dois negócios jurídicos distintos), a propriedade só se transfere por meio de um ato real (tradição ou registro). Assim, o princípio da tradição pode ser combinado tanto com o princípio da separação (modelo terá dois negócios jurídicos e um ato real – como é o caso do alemão) ou com o princípio da unidade (modelo terá um negócio jurídico e um ato real – como é o caso do modelo brasileiro).

O modelo brasileiro adotou expressamente nos arts. 1.226, 1.227, 1.245 e 1.267 do Código Civil o princípio da tradição. A propriedade da coisa móvel não se transfere, em razão de transmissão inter vivos, antes da tradição; e da coisa imóvel antes do registro. No entanto, tais dispositivos não exigem um negócio jurídico distinto destinado à transmissão da propriedade (negócio jurídico de disposição), como fazem os §§ 929 I, 873 I BGB. Logo, não adotam o princípio da separação, vigente no direito alemão; mas apenas o da tradição.

No sistema do título e do modo brasileiro, o fundamento jurídico ou causa de mutação jurídico-real está no título, notadamente um contrato[3]. No entanto, para que ocorra a produção de efeito real, é imprescindível um modo adicional, ou seja, o ingresso no assento registral, daí ser sistema de título e modo. Não se exige um negócio jurídico real (acordo de vontade específico para a transmissão da propriedade.

Os princípios fundamentais são do consensualíssimo e da causalidade, não adotando, por regra, a abstração, excepcionada a hipótese do Registro Torrens.”

 

III. Sistema do Modo:

 

“No sistema do modo puro, há a separação entre negócio jurídico obrigacional (Verpflichtungsgeschäft) e o negócio jurídico real (Verfügungsgeschäft), sendo abstrata a relação entre ambos.

A propriedade se transfere com a combinação do acordo de vontade mais inscrição (para o caso de bens imóveis), não sendo maculada por eventual vício do negócio jurídico obrigacional. Aqui o assento registral é constitutivo, uma vez que é imprescindível a sua ocorrência para a transmissão imobiliária.

O Código Civil Alemão, nos §§ 873 I, 925 I BGB, exige a concorrência do negócio jurídico de disposição e da inscrição para a constituição, modificação e transmissão de direitos sobre imóveis.”

 

 

 

[1] M. V. A. Sousa Jardim, Efeitos Substantivos s do Registo Predial – Terceiros para efeitos de registo, Coimbra, Almedina, 2013.

[2] M. V. A. Sousa Jardim, Efeitos Substantivos s do Registo Predial – Terceiros para efeitos de registo, Coimbra, Almedina, 2013.

[3] M. Pietrek, Konsens über Tradition? Eine Studie zur Eigentumsübertragung in Brasilien, Deutschland und Portugal, Tübingen, Mohr Siebeck, 2015, pp. 43 e ss; F. Sabadin Medina, Compra e Venda de Coisa Incerta no Direito Brasileiro: uma análise do dever do vendedor no Código Civil de 2002, Tese (Doutorado) – Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, São Paulo, 2018, pp. 128 e ss.

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