“O legislador do Código de Processo Civil de 2015 assevera que a averbação do arresto no registro competente gera presunção absoluta de conhecimento por terceiros (art. 844 do CPC/2015). Sendo assim, o Código de Processo Civil de 2015 prestigiou a boa-fé dos adquirentes de imóveis, objeto de constrição judicial desprovida de publicidade registral.
Em melhor explicação, o lançamento do arresto no fólio real é o requisito para considerar a má-fé daqueles que constituíram, modificaram ou transmitiram direitos reais sobre imóveis após a publicidade registral dessa informação. Adotou-se o caráter preventivo do processo executivo mediante a obrigação do credor de dispor o lançamento do arresto no fólio real, para gerar a oponibilidade erga omnes em face dos futuros adquirentes do imóvel[1].
Embora a Lei dos Registros Públicos preveja a obrigatoriedade do registro do arresto e do sequestro, ela foi por muito tempo flexibilizada, visto que o registro destas medidas tinha natureza de mera notícia, sem impedir a disposição do bem pelo proprietário. Além disso, os efeitos da fraude à execução não estavam atrelados ao registro imobiliário[2].
Dessa forma, durante muito tempo a eficácia do arresto e do sequestro independia do Registro de Imóveis, emanando exclusivamente do âmbito jurisdicional. Para uma corrente jurisprudencial e doutrinária, inclusive, o caráter obrigatório do registro do arresto e do sequestro – enunciado no art. 169 da Lei nº 6.015/1973 – referia-se a matéria probatória, dispensando-se a sua inscrição para fins de gerar efeitos perante terceiros.
Mais adiante, ganhou relevo uma segunda corrente processual, entendendo que a eficácia perante terceiros estava condicionada ao seu registro imobiliário. Argumentava-se que o Registro de Imóveis, por concentrar todas as informações atinentes ao imóvel – o que não ocorre no âmbito judicial – com efeitos oponíveis erga omnes, seria um modo mais seguro e eficiente para publicizar a medida. Entende-se, nessa linha, que a exigência do registro para caracterizar a boa-fé dos adquirentes se conforma à confiabilidade das informações do Registro de Imóveis, bem como aos interesses de terceiros interessados.
Inclusive, a Lei nº 13.097/2015, recepcionada pelo Código de Processo Civil de 2015, trouxe diretrizes importantíssimas quanto à obrigatoriedade da averbação da constrição judicial para a eficácia perante terceiros, sobretudo como requisito para a alegação de fraude à execução. Embora a obrigatoriedade de submissão ao fólio real se mostre evidente na própria Lei nº 6.015/1973 (cujo art. 169 reforça o caráter obrigatório do registro dos atos previstos no art. 167), essa obrigatoriedade, de fato, não servia para caracterizar a boa-fé contratual dos adquirentes. Não tinha, afinal, o efeito de tornar inoponíveis as constrições ou atos judiciais não inscritos no Registro Imobiliário ao terceiro de boa-fé que fosse parte em negócios constitutivo, translativo ou modificativo de direitos reais sobre o imóvel descrito na matrícula.
Veja-se que a Lei nº 13.097/2015 não é uma novidade, no sentido próprio da palavra, em matéria de arresto e de sequestro, na medida em que a obrigação de averbar as constrições judiciais nos assentos imobiliários já existia no caput do art. 169 da Lei nº 6.015/1973. Porém, forneceu novos subsídios à sua interpretação. Isto porque a Lei nº 13.097/2015 atribuiu efeitos substantivos ao descumprimento da obrigação de registrar ou averbar na matrícula imobiliária as constrições judiciais (arresto, sequestro e penhora) e demais atos e decisões que atingem um determinado imóvel (averbação premonitória, indisponibilidade, registro de citação de ação real ou reipersecutória, dentre outras). Vale dizer, a Lei nº 13.097/2015 expressamente disciplinou os efeitos da falta de inscrição desses títulos e os efeitos processuais derivados do status da legitimidade registral.
Deve-se, no entanto, considerar a regra contida no caput do art. 54, segundo a qual os negócios jurídicos que constituam, transfiram ou modifiquem ônus sobre o imóvel não terão eficácia em relação aos atos anteriores, se já registradas ou averbadas na matrícula do bem eventuais constrições judiciais, dentre elas o arresto e o sequestro[3].
Logo, a obrigatoriedade de registro das constrições judiciais, ratificada e reforçada pelo art. 54 da Lei nº 13.097/2015, deu mais eficiência à concentração de informações na matrícula, por prever uma forma de sanção jurídica aos exequentes negligentes. Assim, o propósito do registro é dar publicidade a todas as constrições e decisões judiciais que porventura atinjam certo imóvel e, por consequência, tutelar os direitos de terceiros adquirentes de boa-fé.
Percebe-se, portanto, que, embora a validade do arresto independa do registro imobiliário, este é necessário para gerar a presunção de conhecimento dos terceiros interessados no imóvel.”
Fonte: V.F. Kümpel, C.M. Ferrari, Tratado Notarial e Registral: Ofício de Registro de Imóveis, v. 5, tomo II, São Paulo, YK, 2020.
[1] V. Abreu Amadei, Penhora Imobiliária no novo Código de Processo Civil, in R. Dip (coord.), Direito registral e o Novo Código de Processo Civil, Rio de Janeiro, Forense, 2016, p. 113
[2] A Caução e o Registro de Imóveis, in Boletim do Colégio Registral do Rio Grande do Sul, 15 (2000);
[3] É o que muito bem contempla N. Andrighi – R. Dip, Apontamentos Acerca dos Registros Públicos – Lei 13.095/2015, in R. Dip – S. Jacomino – J. Passos (coord.), Registros Públicos e Notas – Conselho Nacional de Justiça – Atos normativos apontados, São Paulo, Quinta Editorial, 2015.