Qual a Natureza Jurídica dos Direitos da Personalidade?

Há diversas teorias que buscam explicar a natureza jurídica dos direitos da personalidade, procurando fixar a origem de sua “essencialidade”, que lhes reserva uma posição de proeminência perante os demais direitos subjetivos.

Para a teoria dos direitos inatos, fundada na escola do direito natural, e manifestada de modo emblemático na Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão de 1789, a existência das garantias fundamentais seria derivada da própria condição humana, sendo, portanto, um dado anterior à própria noção de Estado. Em outras palavras, a referida vertente sustenta a existência de direitos subjetivos preexistentes ao Estado (independentes de positivação, portanto). Da anterioridade desses direitos decorreria o fato de que o Estado, ao positivá-los, não os estaria criando, mas tão somente reconhecendo sua existência, que seria, por sua vez, deduzível pela pura razão[1].

Em contraposição à escola do direito natural, a escola histórica sustenta a essencialidade que reveste tais direitos, elevando-os ao status de “direitos da personalidade”, e decorreria do “modo de encarar a posição do indivíduo no seio da sociedade”, fator indissociavelmente ligado aos valores vigentes em cada sociedade e em cada época[2].

Nesse sentido, o grupo de direitos qualificados como “essenciais” seria inexoravelmente mutável, daí a importância da neutralização desses direitos no ordenamento positivo, que passa então a refletir as ideias e valores dominantes do seio social, atribuindo proeminência aos direitos considerados essenciais no contexto circundante. A vertente afasta-se dos postulados do direito natural, sustentando que os direitos da personalidade vincular-se-iam ao direito positivo, e não à mera razão humana[3].

O caráter inato dos direitos da personalidade nada mais seria que uma opção do ordenamento jurídico, em atribuir de forma automática a personalidade, e seus consectários, a determinados entes por ele selecionados. Em outras palavras, o fato de o sistema jurídico exigir tão somente a personalidade como suporte fático para a incidência dessas garantias fundamentais não lhes retiraria o caráter de direitos positivos, já que a incidência automática é determinada pelo próprio consequente da norma[4].

Dessa forma, os direitos da personalidade devem ter expressa disposição legal, pois sem legalidade não há a publicidade e, via de consequência, também inexistirá a oponibilidade erga omnes.

Fonte: KÜMPEL, Vitor Frederico et. al., Tratado Notarial e Registral vol. II, 1ª ed, São Paulo: YK Editora, 2017, p. 168.


[1]     A. de Cupis, I diritti della personalità, trad. Port. De A. V. JARDIM – A.M. CAIEIRO, Os Direitos da Personalidade, Lisboa, Morais, 1961, pp. 25-26.

[2]     Cf. G. Alpa, Manuale de diritto privato, 7° ed., Padova, CEDAM, 2011,  pp. 221-222.

[3]     A. de Cupis, I diritti della personalità, trad. Port. De A. V. JARDIM – A.M. CAIEIRO, Os Direitos da Personalidade, Lisboa, Morais, 1961, pp. 24-25.

[4]     Cf. G. Alpa, Manuale de diritto privato, 7° ed., Padova, CEDAM, 2011, pp. 219-220.