A cédula de crédito rural, com a entrada em vigor da Lei nº 13.986/2020, foi retirada do rol de títulos registráveis, presente no art. 167, inciso I, da Lei nº 6.015/1973. Dessa forma, tal cédula não mais é passível de registro.
Em outras palavras, a Lei nº 13.986/2020 revogou algumas disposições do Decreto-Lei nº 167/1967 (arts. 30 a 40), bem como da LRP (art. 167, I, 13 e art. 178, I), determinando, assim, que as cédulas de crédito rural não mais serão registradas no Registro de Imóveis.
Garantias da cédula de crédito rural
Sobre as garantias da cédula de crédito rural importante atentar-se ao disposto no art. 60 do Decreto-Lei nº 167/1967, in verbis:
“Art 60. Aplicam-se à cédula de crédito rural, à nota promissória rural e à duplicata rural, no que forem cabíveis, as normas de direito cambial, inclusive quanto a aval, dispensado, porém o protesto para assegurar o direito de regresso contra endossantes e seus avalistas.
§ 1º O endossatário ou o portador de Nota Promissória Rural ou Duplicata Rural não tem direito de regresso contra o primeiro endossante e seus avalistas.
§ 2º É nulo o aval dado em Nota Promissória Rural ou Duplicata Rural, salvo quando dado pelas pessoas físicas participantes da empresa emitente ou por outras pessoas jurídicas.
§ 3º Também são nulas quaisquer outras garantias, reais ou pessoais, salvo quando prestadas pelas pessoas físicas participantes da empresa emitente, por esta ou por outras pessoas jurídicas.
§ 4º Às transações realizadas entre produtores rurais e entre estes e suas cooperativas não se aplicam as disposições dos parágrafos anteriores”.
Verifica-se que “o art. 60, § 3º, do Decreto-Lei nº 167/1967 considera nulas quaisquer outras garantias, reais ou pessoais, salvo quando prestadas pelas pessoas físicas participantes da empresa emitente, por esta ou por outras pessoas jurídicas.
“O referido dispositivo, assim, determina que a cédula de crédito rural hipotecária ou pignoratícia – ou seja, vinculada a garantia real – inviabiliza a constituição de outra garantia, ressalvadas aquelas oferecidas pelo seu emitente. Porém, caso a cédula tenha sido emitida por empresa, o dispositivo ressalva a hipótese de garantia dada pelos sócios da própria empresa que emitiu a cédula, ou por outra pessoa jurídica.
O legislador também permitiu, no § 4º do mesmo art. 60, que terceiras pessoas prestassem garantia de tal natureza, desde que o emitente da cédula fosse uma empresa. Afora essa hipótese, aplicava-se a regra da nulidade das garantias, reais ou pessoais, prestadas por terceiros em cédula rural hipotecária sacada por pessoa física.
A topografia dos dispositivos, contudo, suscitou divergências quanto ao campo de incidência da referida vedação. Para uma primeira corrente, os referidos §§ 3º e 4º diriam respeito ao caput, de modo que a vedação se estenderia à cédula de crédito rural, à nota promissória rural e à duplicata rural. Uma segunda corrente, porém, entende que os dispositivos se referem ao § 2º, que trata da nota promissória rural e da duplicata rural, de modo que a vedação não se aplicaria à cédula de crédito rural.
Esse impasse foi endereçado ao Superior Tribunal de Justiça, que inicialmente firmou posicionamento no sentido de que o § 3º do art. 60 em questão deve ser observado também em relação às cédulas de crédito rural. Na ocasião, as decisões do Conselho Superior da Magistratura do Estado de São Paulo, nos processos de suscitação de dúvida registral, adotaram a concepção do tribunal, impedindo o acesso do título à tábula registral quando desrespeitada a mencionada regra.
Porém, recentemente, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça frisou que a interpretação sistemática do supracitado art. 60 não deixa dúvidas de que o significado da expressão “também são nulas outras garantias, reais ou pessoais”, disposta no § 3º, refere-se diretamente ao § 2º, ou seja, dirige-se apenas às notas e duplicatas rurais, excluídas as cédulas de crédito rural. Considerou-se que a redação da norma, iniciada com o advérbio “também”, denota continuidade à disposição do § 2º, segundo a qual “é nulo o aval dado em Nota Promissória Rural ou Duplicata Rural, salvo quando dado pelas pessoas físicas participantes da empresa emitente ou por outras pessoas jurídicas”.”
Fonte: KÜMPEL, Vitor Frederico et. al., Tratado Notarial e Registral vol. V, Tomo II, 1ª ed, São Paulo: YK Editora, 2020, p. 2741/2765.